Quando, na Parte II, estudamos os aspectos tecnológicos do entalhe do revestimento de mármore que outrora recobria a Grande Pirâmide, estabelecemos uma comparação entre a “opera magna” da moderna tecnologia de precisão – o espelho do telescópio do Monte Palomar – e os 25.000 primas ópticos de 16 toneladas do revestimento, cada um dos quais representava, por si só, uma tarefa de entalhe óptico equivalente ao polimento do famoso espelho.
Esta imensa tarefa de micrometria – de acordo com a exatidão dos planos de cada unidade e à ajustada correlação mútua observada por Petrie – devia produzir quatro espelhos planos de precisão óptica de 1,7 hectares de superfície cada um. Se tal obra não tivesse sido destruída, a pirâmide seria hoje um “instrumento óptico” monumental – algo inimaginável mesmo para os ópticos da Era Cósmica.
Não pareceu oportuna naquela ocasião analisar a possível finalidade de uma obra de tanto fôlego, mas pareceu claro que nenhum objetivo importante presidiu à execução de uma tarefa que triplicou o custo total da pirâmide.
Depois do já visto sobre o significado metrológico da pirâmide e sua vinculação à estrutura geodésica e astronômica, resulta de certo modo evidente que a altura da pirâmide não foi uma magnitude qualquer senão, precisamente, um comprimento que em escala decimal representava a distância ao Sol. Aceita esta hipótese, que as análises anteriores tornam muito plausível, o minucioso esforço de precisão que deveu desenvolver-se em toda a largura e profundidade do revestimento se cristaliza no único objetivo da determinação, com a máxima exatidão possível, da Unidade Fundamental da astronomia, que ainda hoje continua sendo a distância do Sol.
Perfeitamente justificada, por nossos modernos conceitos científicos, a façanha tecnológica executada pelos antigos, se faz evidente que sua correta interpretação dependerá do ajuste entre os dois fatores fundamentais envolvidos pelo problema: 1) a verdadeira distância ao Sol; 2) a verdadeira altura da pirâmide.
Com relação ao primeiro, convirá recordar que existem três maneiras de interpretar a “verdadeira” distância ao Sol. Uma delas corresponde à menor distância ao Sol (periélio); outra, à maior distância ao Sol (afélio); a terceira, é a média, ou seja, o raio maior da elipse, chamado também a Unidade Astronômica. Já víramos que dada a equivalência das três definições, do ponto de vista astronômico, razões construtivas faziam aconselhável indicar o valor do periélio na altura da pirâmide.
As medições astronômicas mais recentes correspondem à aproximação de Eros (1º de janeiro de 1931), ocasião em que a moderna astronomia pôs em jogo todos os seus recursos para a obtenção de 2.800 chapas fotográficas, tiradas através de 20 telescópios de diversos países, e o rigoroso cálculo ortocromático da luz das estrelas localizadas sobre a trajetória do planetóide, com o fito de obter uma correção precisa da refração atmosférica. Dez anos de cálculo permitiram, por volta de 1942, a obtenção da moderna cifra de 149,670 x 10^6 km, considerado até há pouco como o valor mais provável da distância média do Sol.
Pelo plano de 1959, Price e Gunn, utilizando o radar, determinaram a distância de Vênus, o que importou em uma correção da U.A. que Herrick, Westrom e Makemson (9) avaliaram em:
(149,470 +/- 0,001) x 10^6 km
considerando-se na atualidade que o método de microondas nos dá valores mais exatos que as determinações astronômicas.
Quanto aos valores mais antigos, convém mencionar o aceito por volta do ano de 1900, que era de 152,00 x 10^6 km, e o utilizado até a véspera do acontecimento de 1931, que era de 149,43 x 10^6 km. Com o auxílio do valor da excentricidade da eclíptica (e = 0,0167), podemos calcular os valores de periélio que aparecem na Tabela VI.
Quanto à verdadeira altura da pirâmide, ela foi calculada por Borchardt (14) e Cole (24) com o auxílio da “Survey of Egypt”, e estimada em 146,595 metros. Baseia-se este cálculo no valor médio dos quatro lados da pirâmide e na aceitação como inclinação das faces da pirâmide, do valor 22/7 pi (primeiro número de Arquimedes).
A interpretação do autor para a altura da pirâmide difere da de Borchardt-Cole em apenas 3mm. Aceita o valor da inclinação, correspondente a 22/7, mas utiliza a média dos três lados, norte, sul, e oeste, que difere apenas em 3mm do valor do lado oeste. Quanto ao lado leste, já vimos (cf. A Mensuração, Cap. III) que sua inclinação permitia determinar o valor do “erro” admitido pelos construtores, em seu cálculo da distância ao Sol. Este procedimento, que nos é familiar depois do estudo da Câmara do Rei, nos permite escrever, para o comprimento do lado da base: L = (230,355 +/- 0,100)m. Daqui, podemos calcular uma altura da pirâmide que nos dá, para a distância do Sol:
R = (146,592 +/- 0,05) x 10^6 km
onde se deve destacar o exagerado valor do erro aceito, que contrasta com os exíguos valores da determinação por radar. Isto é, repetição de uma situação que já víramos a propósito dos erros de massa admitidos para as determinações da Câmara do Rei.
Como era de se esperar, na expressão da distância do Sol, não esqueceram os antigos astrônomos de indicar o erro possível. E isto é muito importante, pois “uma medida tem sentido só quando se pode avaliar de uma ou outra forma o erro de que está afetada”.
Com isto, fica suficientemente esclarecido o misterioso objetivo perseguido com a extrema precisão do revestimento da Grande Pirâmide; resta como problema, resolver se aquelas antigas medidas impõem uma revisão de nossos cálculos modernos, ou indicam uma modificação nas dimensões da eclíptica.
TABELA VII
Distância ao Sol (periélio)
(km x 10^6)
Ano 1900 149,46
Ano 1930 146,93
Ano 1940 147,17
Ano 1960 146,97
Egito – 146,60
Mas, à parte o objetivo puramente científico de indicar a distância do Sol com a máxima exatidão, também esteve presente na magna tarefa uma intenção artística. Podemos nos convencer, apenas imaginando a esplendorosa beleza daquela gema, talhada em octaedro por um Titã, que fulgurava qual ouro brunido, sob os raios do Sol.
Quem, mais indicado que seu próprios autores para descrevê-la? O poeta-astrônomo viu-a como “tendo a glória do Sol, e sua luz como a mais preciosa pedra, assim como uma pedra de jaspe, clara como um cristal”.
Fonte: O enigma das pirâmides, J. Alvarez Lopes, editora Hemus, 1978, pp. 193-196.
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