A Grande Pirâmide
Posted by luxcuritiba em abril 19, 2008
Heródoto, o historiador grego, apesar de haver criticado bastante o o Egito e seus habitantes, deixou para a humanidade uma documentação surpreendente e preciosa.
“Keóps”, escreve ele “deixou atrás de si uma obra colossal, sua pirâmide. Dizia-se que até o reinado do Faraó Ramsinitos era o Egito muito próspero e bem governado. Keóps, que sucedeu a Ramsinitos, fez com que todos os egípcios trabalhassem para ele. Uns foram encarregados de transportar até o Nilo as pedras extraídas das canteiras dos montes da Arábia; outros deviam carregá-las em barcos para cruzar o rio e arrastá-las desde os montes da Libia. Havia sempre cem mil homens trabalhando, cuja troca se dava a cada três meses. Dez anos foram gastos para ser construído o caminho que devia servir para transportar as pedras e foi aquela uma obra que nada tinha a dever às próprias pirâmides.
Media a estrada cinco estádios (923,50 metros). Estava construída com pedras polidas nas quais se haviam gravado figuras de animais. Somando-se a isto, tiveram que trabalhar dez anos para terminar a calçada, construir as câmaras subterrâneas que deviam servir de tumba. A construção da pirâmide mesmo necessitou de vinte anos de trabalho. Era quadrada. Cada uma de suas faces mede 8 pletos (246,26 metros) e tem a mesma medida de altura. As pedras são polidas e unidas com cuidado, sendo que nenhuma delas mede menos de 30 pés (9,24 metros)”.
O relato de Heródoto sobre a construção da grande pirâmide nos proporciona indicações muito precisas, desde os caracteres típicamente egípicios, até as somas pagas para a construçaõ daquele estranho edifício. E assim prossegue ele: Esta pirâmide foi primeiramente construída em forma de grande escada, composta pelo que alguns chamam de almenas e outros de gradas. Depois de ser-lhe dado esta primeira forma, levantaram-se as outras pedras por meio de Máquinas (Heródoto não descreveu o tipo de máquina a que se referiu) feitas de madeira cortada. Uma vez levantada a pedra até a primeira grada, colocava-se uma outra máquina que ali se encontrava com a qual se levantava até a segunda grada, e assim sucessivamente de grada em grada, pois havia tantas máquinas quantas gradas. O imporatante era a máquina, fácil de transportar, que era trasladada de um piso a outro depois de desarmada. Indicamos ambos procedimentos, pois assim nos foi relatado. A pirâmide leva inscrições que indicam em caracteres egípicios quantos rábanos, quantas cebolas e quantas de alho se gastaram para com os trabalhadores, e se bem recordo as palavras do intérprete que traduzia as inscrições, a soma alcançou seis mil talentos de prata, o que equivale a 41.884 quilos de metal. Se isto for verdadeiro, quantos mais talentos de prata se terão gastos para alimentar e vestir os obreiros?
Quatro séculos depois de Heródoto, o historiador Diodoro da Sicília (século I a.C.) visita o Egito e também se acorre as pirâmides que se conta entre as sete maravilhas do mundo. Igualmente ao seu predecessor, Diodoro de Sicilia se admira frente aos monumentos. “Tenho que reconhecer”, disse, “que estes monumentos são mais importantes do que tudo que se pode ver no Egito, não só pela magnitude de sua massa e das somas que foram gastas, senão também por sua beleza”.
Diodoro da Sicilia nos dá em seguida sua versão da construção das pirâmides. Seu relato fala também de três pirâmides, que representa como o conjunto funerário da IV Dinastia, do qual a Grande Pirâmide é seguramente o elemento mais importante e prestigioso, porém impossível de ser estudada e entendida fora deste contexto.
Tal como Heródoto, Diodoro de Sicilia estima em seis mil talentos a soma gasta em rábanos, cebolas e cabeças de alho para os trabalhadores da grande pirâmide. Porém, contráriamente a Heródoto não crê que os monumentos sejam as tumbas dos Faraós, os quais, em sua opinião, estão sepultados em lugares escondidos e secretos.
Todos os grandes escritores da antiguidade, assim como Heródoto e Diodoro de Sicilia têm ficado igualmente impressionados pela originalidade e pela beleza dos monumentos funerários egípcios.
Chegando-se em Gizé, o espetáculo que se oferece aos olhos do visitador é um dos mais harmoniosos criados pelo ser humano. Há um refrão egípcio que diz: “Todo o mundo teme ao tempo, porém o tempo teme às Pirâmides”.
A Grande Pirâmide tem sido motivo de estudos, interpretações, fonte de inspiração para crédulos e incrédulos; místicos e não místicos especulam o seu por que e para que. Isto tem dado motivação e impulsionado muitos a sobre ela escrever, investigar, pesquisar, enfim, buscar decifrar o seu sentido, a sua causa, os seus autores e até mesmo se os seus projetistas pertenceram ou não a este mundo.
A transcrição que se segue é bem reveladora do interêsse despertado pela Grande Pirâmide, pelos mistérios que a mesma encerra:
“No início de 1985, após alguns dias de mergulho no mar Vermelho, ao largo da costa egípcia, dois arquitetos franceses foram conhecer a Grande Pirâmide em Gizé. Ao examinar a enorme estrutura, notaram que diversos detalhes arquitetônicos simplesmente não faziam sentido. Alguns dos imensos blocos de pedra, por exemplo, foram colocados verticalmente, e não em sentido horizontal como os outros. Em certas partes da pirâmide, curiosos blocos irregulares sobressaem meio à pedra calcária polida. Assim como gerações de visitantes das pirâmides, os arquitetos Gilles Dormion e Jean-Patrice Goidin ficaram cativados pelo grande monumento. E também, como muitos outros, acharam que podiam desvendar seus enigmas. As anomalias estruturais, deduziram os franceses, eram indícios de câmaras ocultas e ainda inexploradas, no interior da pirâmide. Eles achavam que uma dessas câmaras secretas talvez até abrigasse os despojos do faraó Quéops, e que poderiam, assim, solucionar uma das eternas questões sobre a pirâmide: onde está o corpo para o qual ela supostamente foi construída?
Dormion e Goidin dispunham de significativa vantagem tecnológica em relação a investigadores anteriores. Após inúmeras visitas exploratórias às galerias internas, eles retornam em agosto de 1986 com um microgravímetro, um sofisticado aparelho capaz de registrar vazios de densidade, ou cavidades no interior da pirâmide. E, por trás das paredes de uma galeria que levava a um aposento conhecido como Câmara da Rainha, o aparelho detectou os vazios previstos pelos arquitetos. Encorajados por esse resultado, os dois conseguiram permissão do governo egípcio para perfurar a antiga parede de calcário.
Durante dias, os arquitetos e seus auxiliares trabalharam nos apertados corredores da pirâmide, perfurando cerca de dois metros em três locais diferentes. Mas tudo que descobriram foram bolsões de areia cristalina. O microgravímetro podia indicar a presença de cavidades na estrutura da pirâmide, mas não era capaz de determinar sua localização exata. As câmaras secretas, se existem, permaneceram ocultas. A Grande Pirâmide frustrara mais uma tentativa no longo e fascinante esforço de solução de seus perenes enigmas.
Desde a época dos gregos clássicos, os homens contemplam esse último sobrevivente das sete maravilhas do mundo antigo e se colocam questões que não conseguem responder. Como ela foi construída? Se era uma sepultura, como em geral se supôs, por que jamais foram encontraram símbolos ou objetos da realeza – para não falar do corpo do faraó? Se não era uma tumba, então para que foi erguida? E de que modo foi construída? Como, dadas as técnicas de construção da época, explicar a extraordinária exatidão de sua estrutura, seu alinhamento quase perfeito em relação aos pontos cardeais, a elegante precisão de sua alvenaria? Se o projeto da pirâmide incorpora avançados conhecimentos matemáticos e astronômicos, conforme muitos estudiosos acreditam, como foi que os egípcios adquiriram tal sabedoria antes de outras civilizações? Poderia o enigmático edifício ser a chave para algum tipo de poder místico desconhecido pela ciência moderna?
Não foram poucos os arqueólogos, astrônomos, estudiosos da religião e diletantes que discutiram tais questões ao longo dos séculos. Enquanto os arqueólogos que estudam as pirâmides apenas como artefatos históricos, os outros investigadores podem, em geral, ser classificados em três linhas de pensamento. A primeira, e mais comum, argumenta que a pirâmide representa um sistema universal de medida, que suas próprias dimensões expressam medidas arquetípicas de extensão e até mesmo de tempo. No século XIX, um grupo dissidente de estudiosos deu origem à segunda escola, que privilegia as extraordinárias propriedades da pirâmide enquanto gigantesco relógio solar e observatório astronômico. Os “arqueo-astrônomos” defendem à concepção de que os construtores das pirâmides possuíam conhecimentos de astronomia e das dimensões da Terra muito superiores ao que se possa imaginar.
Com a continuação do fascínio pelas pirâmides, surgiu no século XX uma terceira escola, muito mais especulativa, que se concentrou na própria forma da pirâmide e em seus efeitos físicos sobre seres vivos e objetos inanimados. Esses pesquisadores afirmam que a forma de pirâmide pode, de algum modo, ajudar no crescimento de plantas, manter os alimentos frescos por mais tempo e até mesmo reconstituir o fio de lâminas de barbear. Outros tentaram explicar os conhecimentos matemáticos supostamente inscritos na forma das pirâmides imaginando que seus construtores tivessem vindo da desaparecida Atlântida, ou té mesmo de outros planetas, ou de ambos. A pirâmide mantém-se em obstinado silêncio.
A pirâmide de Quéops ergeu-se em sua enigmática majestade no planalto rochoso de Gizé, 16 quilômetros a oeste do Cairo. Através de acácias, eucaliptos e tamarineiras que ornamentam o bulevar que dá acesso ao planalto, ergeu-se no terreno plano e varrido pelo vento à margem do deserto Líbio, de modo abrupto e dramático, uma assombrosa montanha de pedra cor-de-areia dominando os luxuriantes palmeirais junto ao Nilo. Em épocas passadas, as caravanas que vinham pelo deserto avistavam a pirâmide dias antes de alcançarem-na, um minúsculo triângulo no horizonte tornando-se cada vez maior em sua simétrica perfeição. A pequena distância, sua imponência é esmagadora. Os números dão uma pálida idéia de sua imensidão – a base ocupa uma área de 53 mil metros quadrados e a estrutura é composta de cerca de 2,3 milhões de blocos de calcário, cada um pesando 2,5 toneladas. Com a pedra usada em sua construção seria possível erguer um muro com blocos de 90 centímetros cúbicos, suficiente para cobrir dois terços da linha do Equador, totalizando 26 mil quilômetros.
A Grande Pirâmide e as duas outras existentes no mesmo local – atribuídas aos sucessores imediatos do faraó Quéops – foram erguidas durante o período da história egípcia conhecido como IV Dinastia, entre 2613 e 2494 a.C. Os egiptólogos acreditam que Quéops (assim o chamavam os gregos; seu nome egípcio era Khufu) mandou construir o imenso edifício para que servisse de sepultura e monumento a si mesmo. A camada externa era originalmente composta de blocos de calcário polido, encaixados uns nos outros com apurada precisão, mas esse invólucro de pedra foi retirado no século XIV e usado na construção do Cairo. Em algum momento na história, a pedra original do topo, que acrescentava 9 metros à altura da pirâmide, também foi removida.
Com base em seus conhecimentos acerca da religião egípcia, os egiptólogos afirmam que a forma da pirâmide estaria associada ao culto do sol. As laterais inclinadas, dizem eles, assemelham-se à difusão dos raios solares ao alcançarem a Terra a partir de uma nuvem e, por isso, a pirâmide representaria uma escada para o céu. Alguns estudiosos do antigo Livro Egípcio dos Mortos, como o escritor ocultista moderno Manly P. Hall. sustentam até mesmo que a pirâmide proporciona mais do que uma passagem simbólica para os domínios celestiais. segundo Hall, o edifício era um templo secreto onde os eleitos passavam por um ritual místico que os tornava divinos. Os iniciados permaneciam durante três dias e noites no interior da pirâmide enquanto seus ka – almas ou essências – deixavam os corpos e entravam nas “esferas espirituais do espaço”; assim “alcançavam a verdadeira imortalidade” e tornavam-se iguais aos deuses.
Em um plano mais terreno, restam muitas dúvidas sobre o modo como, em uma época sem roldanas ou mesmo rodas, foi construída a maciça pirâmide. Os arqueólogos, contudo, propuseram uma explicação geral: os construtores aplainaram de algum modo o local e em seguida delimitaram os lados da pirâmide baseando-se na observação das posições das estrelas circumpolares. Nas pedreiras situadas a poucos quilômetros, os pedreiros cortavam o calcário com martelos de pedra e cinzéis de cobre. Grupos de centenas de homens arrastavam os blocos até o local da construção; o granito usado em algumas partes internas foram trazidos de balsa, pelo Nilo, de um lugar a 640 quilômetros. Para erguer os blocos de várias toneladas pelas laterais da pirâmide, os construtores podem ter usado uma rampa de terra em espiral, embora alguns especialistas acreditem que tenham usado alavancas para mover algum tipo de elevador. Os blocos eram em seguida encaixados com precisão milimétrica, demonstrando uma habilidade que impressiona os engenheiros contemporâneos.
Muitos estudiosos duvidaram que uma estrutura tão imponente quanto a Grande Pirâmide – um milagre de engenharia, um prodígio de décadas de trabalho estafante – tivesse sido construída para abrigar uma única múmia de faraó. Explicações alternativas foram propostas desde antes da era cristã. O historiador romano Júlio Honório afirmou que as pirâmides serviam para armazenar cereais. (Outro escritor da Antigüidade achava que eram vulcões extintos). Os árabes, que dominaram o Egito durante séculos, pensavam que fossem repositórios de conhecimentos antigos construídas por reis que temiam uma catástrofe, talvez o dilúvio; os contos populares da região diziam que na Grande Pirâmide estavam gravados um guia para as estrelas e uma profecia do futuro. A superstição dava origem a lendas; segundo os árabes, fantasmas assombravam os corredores e uma mulher nua com dentes estragados seduzia os invasores levando-os à loucura.
O historiador grego Heródoto foi o primeiro a registrar de modo sistemático informações sobre a Grande Pirâmide. Heródoto visitou Gizé no século V a.C., quando o monumento já existia há 2 mil anos, e descreveu sua construção com base nas conversas que manteve com os egípcios. Impossibilitado de penetrar no interior do edifício (a entrada estaca escondida), aceitou a explicação de seus informantes de que a pirâmide era uma sepultura construída para o tirânico Khufu. A câmara mortuária do rei, disseram eles ficava no subterrâneo.
De acordo com Heródoto, 100 mil homens trabalharam na pirâmide, com novas turmas de operários sendo convocada a cada três meses. Eles construíram a estrada entre o rio e o planalto em dez anos; outros vinte foram necessários para completar a pirâmide. Os engenheiros ergueram, passo a passo, os gigantescos blocos pelas laterais da estrutura utilizando “máquinas feitas de curtas tábuas de madeira”. Heródoto não especificou o modo de funcionamento de tais máquinas. Também disseram a ele que os blocos de revestimento externo foram colocados do topo para a base, após o término da estrutura interna. As pedras, polidas e brilhantes, eram recobertas de inscrições – perdidas quando os blocos foram removidos para o Cairo. Heródoto interessou-se pela Grande Pirâmide principalmente enquanto projeto de engenharia. Mas o estudioso seguinte da pirâmide abordou o monumento de uma perspectiva diferente e introduziu o que se tornaria um tema constante: a busca dos conhecimentos matemáticos à disposição dos antigos.
Um califa árabe do século IX, Abdullah Al Mamun, jovem governante de espírito científico com interesse pela astronomia, sonhava fazer um mapa do mundo e outro das estrelas. A pirâmide atraiu sua atenção quando ouviu dizer que as câmaras secretas do monumento continham mapas e tabelas altamente preciosos, compilados pelos construtores. Para os companheiros do califa, talvez atraísse mais a notícia de um grande tesouro escondido no interior da pirâmide.
Historiadores árabes posteriores registraram a dramática história de como o califa e sua equipe de arquitetos, construtores e pedreiros realizaram sua exploração em 820 d.C. Incapazes de encontrar a entrada do edifício, optaram por um ataque direto, aquecendo com fogos o bloco de calcário e em seguida encharcando-os com vinagre frio até racharem. Após abrirem um túnel de 30 metros na rocha, os exploradores por fim alcançaram um estreito corredor de um metro de altura, que subia de maneira íngreme. Na extremidade superior, encontraram a entrada original da pirâmide, 15 metros acima do nível do chão, bloqueada e escondida por uma porta rotatória de pedra. Então, os homens do califa desceram pela galeria original. Depois de se arrastarem de cócoras por uma escuridão de breu, encontraram apenas uma câmara vazia e inacabada. Se havia algum texto secreto ou tesouro do faraó, estavam em outra parte.
A excitação voltou, contudo, quando os homens de Al Mamun desceram pelo corredor e descobriram o que parecia ser uma outra galeria ascendente. Infelizmente, a entrada estava completamente fechada por um enorme bloco de granito, obviamente colocado ali de propósito. O granito era um obstáculo intransponível aos martelos e cinzéis, mas os obstinados árabes descobriram que podiam escavar os blocos de calcário em torno do granito. No entanto, assim que conseguiram ultrapassá-lo, encontraram outro obstáculo de granito e, depois, vários outros. Alguém tomara muito cuidado para evitar que intrusos penetrassem no interior da pirâmide.
Após penosamente abrirem caminho pelos blocos de granito, alcançaram um corredor de teto baixo que subia até cruzar uma galeria nivelada. Esta levou-os a um aposento de teto inclinado, com 6 metros de altura e 6 metros quadrados de área, que depois seria conhecido como a Câmara da Rainha (por causa do costume árabe de enterrar as mulheres em sepulturas com tetos inclinados). Nenhuma rainha foi encontrada e a câmara estava completamente vazia. Extenuados, os árabes retornaram à galeria ascendente e descobriram que ela abruptamente transformava-se em um esplêndido corredor, cujas paredes de calcário polido, com 8,5 metros de altura, receberam mais tarde o merecido nome de Grande Galeria. Ainda subindo, a galeria prolongava-se por mais 50 metros antes de desembocar em uma antecâmara; depois dela estava o maior aposento no interior da pirâmide, uma imponente sala com cerca de 10 metros de comprimento, 5 de largura e quase 6 de altura – mais tarde batizada de Câmara do Rei.
Al Mamun e seus assistentes entraram animados no salão, sem dúvida certos de encontrarem o prêmio fabuloso pelo qual haviam trabalhado tão duro. E ali, junto a uma parede de granito vermelho, eles o viram – um grande sarcófago de pedra marrom, tão grande que a câmara devia ter sido construída em torno dele. Empunhando as tochas, correram para ver o que havia no interior. Não encontraram nada. O sarcófago estava vazio. Terrivelmente desapontados, os árabes arrebentaram parte do assoalho e golpearam as paredes, esperando encontrar algum indício do tesouro. Al Mamun concluiu que o sarcófago sempre estivera vazio, ou que saqueadores haviam pilhado a sala muito tempo antes. Mas se intrusos estiveram antes na câmara, uma questão simples permanecia sem resposta: como conseguiram passar pelos blocos de granito que deram tanto trabalho ao califa e seus homens?
Oito séculos se passaram antes do passo seguinte na busca dos conhecimentos inscritos na pirâmide. Durante esse período, a Europa saiu da Idade Média e iniciou uma era de expansão e conquista do mundo. Aventureiros, mercadores e estadistas estavam igualmente limitados por sua ignorância da geografia mundial e pela inexistência de um sistema único de pesos e medidas. A fim de solucionar isso, os estudiosos voltaram-se – como faziam com frequência – para a Antigüidade, na esperança de encontrar alguma unidade de medida esquecida, que se baseasse no conhecimento preciso das dimensões da Terra.
Com esse objetivo, o matemático britânico John Greaves visitou o Egito em 1638. O erudito de 36 anos passara a maior parte de sua vida em ambientes universitários, primeiro em Oxford e, depois, como professor de geometria no Gresham College, em Londres. Mas os livros, descobriria Greaves, não substituíam a experiência. Ele foi à Itália, onde mediu os monumentos romanos a fim de descobrir o lendário pé romano (uma fração de polegada menor que o pé britânico, concluiu) e depois a Gizé.
Greaves acreditava, assim como o califa Al Mamun, que os construtores da pirâmide haviam tido aceso a conhecimentos geométricos que depois se perderam. Na esperança de descobrir a unidade de medida empregada, Greaves galgou o monte de entulho com 12 metros de altura que se acumulara junto à base e, munido de seus instrumentos, entrou na pirâmide pela abertura feita por Al Mamun. A primeira coisa que encontrou foi uma nuvem de morcegos, que dispersou disparando uma pistola. Em seguida, arrastou-se ao lado dos blocos de granito como os árabes haviam feito, mediu cuidadosamente a Câmara do Rei e o sarcófago (1,97 metro, o que indicou a Greaves que as dimensões humanas não haviam se modificado) e observou maravilhado a exatidão do trabalho de alvenaria.
Sua principal descoberta, todavia, foi um estreito poço que mergulhava nas trevas a partir do assoalho da Grande Galeria. Seria ele uma saída utilizada pelos construtores após terem colocado no lugar os blocos de granito? Uma passagem aberta por saqueadores? Greaves nunca descobriu; os morcegos e as atmosfera insalubre forçaram-no a desistir do reconhecimento do poço após ter descido 18 metros. Encerrou seus estudos concluindo que a pirâmide media 146 metros de altura e tinha 211 metros de lado, na base; esta última estimativa revelou-se depois incorreta. Retornou à Inglaterra, onde publicou um livreto eruditamente intitulado Pyramidographia. O matemático não encontrara a unidade básica de medida que procurava, mas seu livreto, com as medidas e a descrição da pirâmide, chamou a atenção de alguns dos maiores sábios da época.
Por exemplo, William Harvey, o descobridor da circulação do sangue, deduziu corretamente que Greaves deixara de pesquisar um possível sistema de ventilação no interior da pirâmide (descoberto por exploradores posteriores); o fisco Sir Isaac Newton utilizou os números apresentados por Greaves para deduzir medidas que chamou de cúbitos sagrados e profanos. Newton tinha esperança de que tais unidades básicas ajudassem-no a calcular a circunferência da Terra, um valor numérico fundamental para sua teoria de gravitação. Infelizmente os números de Greaves não eram preciosos o suficiente para tal finalidade e Newton precisou aguardar alguns anos até que outros determinassem o comprimento de um grau terrestre.
O assalto seguinte às pirâmides foi literalmente um ataque militar. Em julho de 1978, as disciplinadas tropas francesas sob o comando do general Napoleão Bonaparte derrotaram soldados egípcios armados de cimitarras na sanguinolenta batalha das Pirâmides. E não demorou muito para que o jovem Bonaparte lançasse um ataque contra os segredos da Grande Pirâmide por meio dos cientistas franceses que acompanhavam seu exército.
Os sábios ficaram intrigados por muitas das mesmas questões sobre a pirâmide e seus construtores que haviam fascinado John Greaves mais de um século e meio antes. O estudante mais interessado nos segredos da pirâmide era um jovem cientista chamado Edmé-François Jomard, que vasculhara a escassa e pouco confiável literatura sobre o assunto acumulada ao longo do século. Do mesmo modo que Greaves, estava particularmente ansioso para determinar a unidade de medida empregada pelos construtores e descobrir se estava baseada nas dimensões da Terra – como o era o sistema métrico então recentemente adotado pelos revolucionários franceses. (O metro foi então definido como 1/10.000.000 do quadrante da circunferência terrestre, do Pólo Norte ao Equador.)
Jomard e seus colegas logo desistiram da tentativa de investigar o interior da pirâmide ao depararem com enormes montes de guano depositado por morcegos. Os furiosos animais, relatou um coronel francês, “arranhavam com suas garras e sufocavam com o ácido fedor de seus corpos”. Impossibilitados de seguir adiante, os sábios concentraram-se na parte externa da pirâmide. Auxiliados por uma turma de 150 operários turcos, removeram toneladas de areia e entulho das extremidades noroeste e nordeste; com isso, descobriram duas depressões retangulares no leito rochoso, onde se apoiavam os alicerces originais, removidos séculos antes. Esta descoberta proporcionou-lhes dois bons pontos de referência para a medição da base da pirâmide, embora tal tarefa ainda fosse dificultada pela acumulação de entulho ao longo do lado norte. Jomard mediu primeiro um dos lados da base: 230,9 metros. Em seguida, escalou penosamente a pirâmide até chegar ao que restara do topo, uma plataforma de 13 metros quadrados, de onde tentou, em vão, lançar uma pedra além do perímetro da base. Ao descer, mediu a altura de cada degrau. Altura total: 146,6 metros. Com estes números, Jomard calculou o ângulo de inclinação da pirâmide – 51º 19’ – e seu apótema, ou seja, a linha que une o ápice ao ponto mediano de cada um dos lados da base, cujo valor era 184,7 metros.
O jovem cientista sabia que autores antigos haviam atribuído ao apótema o valor de um estádio. Também sabia que o comprimento de um estádio – uma unidade de medida fundamental na Antigüidade – estava supostamente associado à circunferência da Terra. O valor que obtivera para o apótema, portanto, era um número de grande importância. A seguir, Jomard voltou sua atenção para o cúbito, outra antiga medida de comprimento. Segundo Heródoto, um estádio equivalia a 400 cúbitos; assim, o francês dividiu o valor do apótema por 400, obtendo como medida do cúbito 0,4618 metro. Outros autores gregos haviam afirmado que a base da Grande Pirâmide media 500 cúbitos de lado. Quando Jomard multiplicou 0,4618 por 500 obteve o resultado de 230,9 metros, exatamente o valor que encontrara ao medir o lado da base. O significado disto era claro para Jomard: os egípcios possuíam avançados conhecimentos de geometria. Conhecendo as dimensões da Terra, deduziram suas unidades de medida a partir da circunferência terrestre e registraram tais conhecimentos na Grande Pirâmide. A prova estava nas pedras.
Infelizmente para Jomard, medições feitas com instrumentos pouco precisos em meio aos bancos de areia móveis do deserto podiam ser bastante inexatas. A tarefa de medir a pirâmide era complicada devido aos deslocamentos de areia causados pelos ventos e ao entulho que se acumulava em enormes montes ao redor do monumento. Era preciso um grande trabalho de escavação apenas para aproximar-se da base. Não surpreendeu, portanto, que os colegas de Jomard, ao refazerem as medições da base e da altura, chegassem a resultados ligeiramente diferentes. Além disso, concluíram, nenhuma evidência do cúbito de Jomard podia ser encontrada em outras antigas construções egípcias. No final, os sábios franceses recusaram-se a abandonar a idéia de que haviam sido os gregos, e não os egípcios, os fundadores da ciência da geometria. Quando retornaram à França e publicaram um minucioso relatório de 24 volumes sobre suas descobertas (inclusive a Pedra de Rosetta, chave que permitiu decifrar os hieróglifos egípcios), as concepções obstinadamente defendidas por Jomard não tiveram repercussão.
A expedição francesa e os relatos sobre ela divulgados na Europa provocaram uma explosão de interesse pela civilização egípcia. Os europeus do século XIX ficaram apaixonados pelo Egito: os museus disputavam múmias, estátuas e obeliscos; os artistas pintavam pirâmides em paisagens bucólicas; os criadores dos estilos Império e Regência lançavam mão de temas egípcios; e os aristocratas mandavam entalhar esfinges e crocodilos em seus móveis. Ao morrer, o nobre escocês Alexander, décimo duque de Hamilton, foi ele próprio mumificado.
O tema das pirâmides difundiu-se exatamente na época em que a sociedade européia, especialmente a sociedade vitoriana inglesa, entrava em um período agitado e a ciência moderna parecia ameaçar as crenças religiosas tradicionais. Em reação a isso, alguns eruditos religiosos utilizaram as misteriosas construções egípcias como prova da presença da mão divina no mundo. O primeiro grande defensor dessa teoria foi um editor e crítico londrino chamado John Taylor. Taylor era um homem erudito profundamente religioso, um grande conhecedor das Escrituras, da matemática, da astronomia e da literatura. Após começar a vida como aprendiz de livreiro, Taylor chegara na década de 1820, a editor da London Magazine; seu círculo de conhecidos incluía os poetas John Clare e John Keats. Porém, ele acabou “espantando a metade de seus amigos”, segundo um deles, por causa de sua obsessão, que se prolongaria por trinta anos, pelo mistério da Grande Pirâmide.
Taylor nunca visitou o Egito; em vez disso, construiu um modelo da pirâmide em escala a fim de realizar seus estudos. Descartando a hipótese de a pirâmide ser apenas uma sepultura, Taylor debruçou-se sobre os números obtidos por Jomard e outros em busca de um princípio unificador. Para sua surpresa, descobriu que, ao dividir o perímetro da pirâmide pelo dobro de sua altura, o resultado era um número quase idêntico ao valor de pi (3,14159…), a constante pela qual se multiplica o diâmetro de um círculo para obter sua circunferência. Para Taylor, esta era uma descoberta promissora: se os construtores da pirâmide tinham conhecimento do pi, que havia sido calculado corretamente até a quarta casa decimal apenas no século VI de nossa era, o que mais eles sabiam? No mínimo, concluiu, sabiam o valor da circunferência do globo e, também, a distância de centro da Terra aos pólos. Usando o pi como elo de ligação, Taylor calculou que a relação entre a altura da pirâmide e seu perímetro era igual à existente entre o raio polar da Terra e sua circunferência, ou seja, dois pi. Longe de ser uma simples câmara mortuária, concluiu Taylor, a pirâmide trazia inscrita em sua estrutura a sabedoria dos antigos egípcios. “Ela foi construída para ser um registro das medidas da Terra”, afirmou.
No entanto, Taylor não acreditava que os sábios egípcios da IV Dinastia estivessem de posse dos conhecimentos gravados na pirâmide. Esses conhecimentos deviam ter vindo de Deus. “É provável”, escreveu ele, “que, nas épocas iniciais da sociedade, o Criador tenha proporcionado a alguns indivíduos certo grau e poder intelectual, que os levou muito acima do nível dos posteriores habitantes da Terra. “Deus instruíra os construtores de pirâmides do mesmo modo que orientara Noé para a construção da Arca, escreveu Taylor, segundo o qual a humanidade havia degenerado intelectualmente desde então. Taylor estava com 78 anos quando seu livro A Grande Pirâmide: Por Que foi Construída? Quem a Construiu? foi publicado em 1859. Embora suas teorias fossem bem recebidas em alguns círculos, a Sociedade Real recusou-se polidamente a ouvir uma palestra que ele preparara sobre o assunto. Contudo, antes de morrer, poucos anos mais tarde, Taylor conquistaria pelo menos um adepto influente – o astrônomo-real da Escócia, Charles Piazzi Smyth.
Intelectual e socialmente, Smyth superava Taylor: era filho de um almirante e afilhado do renomado astrônomo italiano Giuseppe Piazzi, o primeiro a descobrir um asteróide. Chegara ao posto de astrônomo-real da Escócia com apenas 26 anos; doze anos depois, um importante ensaio sobre óptica levou-o a ser eleito membro importante da Sociedade Real de Edimburgo, uma honraria cobiçada por todos os cientistas. No entanto, a piramidologia, dificilmente o assunto popular na Sociedade Real da época, acabou dominando sua carreira profissional. Fascinado por Taylor, Smyth abraçou a causa do editor moribundo com um ardor que, como no caso de Taylor, era científico e religioso, além de conter uma parcela de patriotismo. Convencido de que a unidade básica de medida era a por ele denominada polegada piramidal, identificou essa distância como sendo 1/25 de um cúbito, praticamente o mesmo valor de uma polegada britânica. Esta foi uma contribuição oportuna à campanha empreendida pelos cientistas britânicos contra a adoção do sistema métrico decimal elaborado pelos franceses, uma proposta vista por Smyth com sobressaltos nacionalistas.
No final de 1864, o astrônomo – que estava com 45 anos – foi ao Egito, acompanhado de sua mulher, para fazer o que Taylor não havia feito: realizar suas próprias medições e levantamentos. Equipado com os instrumentos mais modernos, inclusive uma câmara, o casal montou seu acampamento em uma tumba abandonada na parede de um rochedo, de onde viam nuvens de morcegos saindo da pirâmide ao anoitecer.
Smyth passou várias noites no topo do monumento, fazendo observações astronômicas que mostraram estar a pirâmide situada a minutos dos 30º de latitude norte. Também observou que a sombra desaparecia completamente no equinócio da primavera e concluiu que isto indicava um avançado conhecimento de astronomia. Suas medições do exterior da pirâmide resultaram em números próximos ainda mais de pi do que os números de Taylor, chegando à quinta casa decimal.
Smyth concordava com Taylor quanto a idéia de que a Grande Pirâmide preservara antigos conhecimentos científicos. As medidas incorporadas em sua estrutura eram “comensuráveis à Terra de maneira mais sábia e admirável”, escreveu ele, “que qualquer outra coisa jamais concebida pelo espírito do homem”. Smyth foi ainda mais longe do que Taylor, afirmando que também medidas de tempo estavam incorporadas na construção da pirâmide. Segundo o astrônomo, o perímetro da estrutura, em polegadas piramidais, era equivalente a mil vezes 365,2 – o número de dias em um ano solar. Com assombrosos conhecimentos físicos, os construtores das pirâmides haviam calculado tudo isso, escreveu Smyth, 1.500 anos antes “do infantil início de tais coisas entre os antigos gregos”.
Em seu livro Nossa Herança na Grande Pirâmide, Smyth concluiu, assim como Taylor fizera antes dele, que apenas Deus poderia ter projetado a Grande Pirâmide. A Bíblia, disse ele, afirma que em épocas passadas Deus conferiu “sabedoria e instruções métricas para construções” a alguns poucos escolhidos “por algum motivo especial e desconhecido”.
Anos mais tarde Smyth afirmaria que a pirâmide também revelava a distância da Terra ao sol quando sua altura em polegadas era multiplicada por dez à nona potência; e dez para nove era a proporção entre a altura e a largura da pirâmide. Além do mais, a pirâmide provava a existência de Deus, e também previa a data da segunda vinda de Cristo.
Embora o pitoresco estilo literário de Smyth tenha ajudado a vender seus livros, ele não convenceu muitos cientistas. Um companheiro da Sociedade Real de Edimburgo classificou suas idéias de “estranhas alucinações nas quais apenas mulheres débeis acreditam”. Um crítico dos Estados Unidos expressou, de modo brincalhão, a visão cética de que os números podiam ser manipulados de modo a provar quase tudo: “Se uma unidade adequada de medida for encontrada”, comentou ele, “um equivalente exato da distância até Timbuctu será encontrado (…) no número de postes da Bond Street, ou na gravidade específica da lama, ou ainda no peso médio do peixe dourado adulto.”
Mesmo assim, a obra de Taylor e Smyth encontrou adeptos, que quanto mais investigavam a Grande Pirâmide, mais descobriam mensagens ocultas de cunho espiritual, científico e histórico. O clérigo norte-americano Joseph Seiss escreveu em 1877 que as pedras da pirâmide continham “um grande sistema de números, medidas, pesos, ângulos, temperaturas, graus, problemas geométricos e referências cósmicas inter-relacionados”. Seiss ficou especialmente impressionado pela inexorável repetição do número cinco: a pirâmide tinha cinco pontas e cinco lados (incluindo a base), e uma polegada piramidal era um quinto de um quinto de um cúbito. Seria apenas coincidência, indagou ele, que tivéssemos cinco sentidos, cinco dedos em cada membro e que fossem cinco os livros de Moisés?
Os piramidólogos também chamaram a atenção para um fato extraordinário: a latitude e a longitude que se cruzam na pirâmide – 30º N e 31º L – passam por mais terras firmes do que quaisquer outras. Seria possível que os antigos egípcios soubessem isso e tivessem construído de propósito a imensa estrutura exatamente no centro do mundo habitável? Em escala menor, um quadrante estendendo-se em linhas retas a nordeste e noroeste a partir da pirâmide abarcava todo o delta do rio Nilo. Os agrimensores da Antigüidade certamente teriam considerado isso de grande utilidade, considerando que viviam em um território regularmente sujeito a inundações periódicas.
O suposto significado religioso, no entanto, foi o que desencadeou os debates mais acalorados na Inglaterra vitoriana. A teoria de muitos piramidólogos, segundo a qual a estrutura da pirâmide teria sido inspirada por Deus, intensificou o choque entre os evolucionistas, recém-armados com as idéias de Charles Darwin sobre as origens da vida, e os cristãos fundamentalistas, que acreditavam na verdade literal da Bíblia.
Smyth e seus seguidores, somando polegadas piramidais, consideravam a pirâmide uma prova irrefutável da existência de uma divindade que criara o mundo em 4004 a.C. – data calculada por um clérigo irlandês do século XVIII, James Usher, e amplamente aceita pelos ortodoxos. Os ancestrais mais remotos do homem, portanto, não teriam sido primatas que viviam em florestas, mas mestres-construtores que seguiam os desígnios de Deus. Nos Estados Unidos, um grupo se formou para defender a adoção de um sistema de medidas baseado nos cúbitos piramidais sagrados, em oposição ao sistema decimal ateu. Um dos membros dessa organização era o próprio presidente da República, James Garfield.
Tal controvérsia em torno das pirâmides exigia, sem dúvida, a contribuição da ciência pura, desvinculada de preconceito e ilusões. Assim, em 1880, um inglês de 26 anos com o altissonante nome de William Matthew Flinders Petrie zarpou para o Egito, carregado de sofisticados instrumentos, com a ambição de dar fim a todas as especulações sobre as dimensões e o alinhamento da misteriosa construção.
Flinders Petrie, como era conhecido, tinha excelentes qualificações, tanto por sua linhagem quanto por sua educação, para essa tarefa. Seu avô materno, o capitão Mattew Flinders, tornara-se famoso por suas expedições na Austrália. Seu pai, William Petrie, era um engenheiro que ficara muito impressionado com as idéias de Taylor e se tornara ele próprio um estudioso de pirâmides, dedicando vinte anos de sua vida ao projeto e fabricação de equipamentos especiais capazes de medir a Grande Pirâmide com uma exatidão sem precedentes. Seguindo o exemplo do pai, o jovem Flinders Petrie lera o livro de Smyth com apenas 13 anos. Fascinado pela noção de diversos padrões de medida, Petrie tornou-se topógrafo e passou a viajar pela Inglaterra, registrando meticulosamente as dimensões de várias construções e antigos sítios megalíticos, como os grandes círculos de pedra de Stonehenge.
Quando chegou ao planalto de Gizé, com abundantes provisões e inúmeras caixas contendo os instrumentos construídos pelo pai, Petrie agiu como muitos outros antes dele e montou seu acampamento em uma tumba vazia no paredão rochoso. em seguida, pôs-se a trabalhar, medindo repetidamente todas as partes da Grande Pirâmide e de suas duas vizinhas menores. Para afastar os aborrecidos e curiosos turistas britânicos, ele às vezes se vestia com uma calça e uma camiseta de cor rosa berrante. No interior quente e poeirento da pirâmide, com frequência trabalhava nu até altas horas da noite, evitando assim encontrar-se com os turistas.
O trabalho não era isento de riscos, como constatou seu amigo, dr. Grant, que certa noite acompanhou o topógrafo em sua expedição. “Passei por momentos terríveis quando ele desmaiou no poço”, escreveu Petrie. “Carregar um homem muito pesado, quase inconsciente, para fora de um poço de 20 metros, com pouco apoio para os pés, e sabendo que a qualquer momento ele poderia nos fazer cair até o fundo, é uma situação de perigo que nunca se esquece.”
Petrie ficou assombrado com a perfeição do trabalho realizado pelos antigos construtores. Utilizando instrumento cuja precisão chegava a 2,4 milímetros, ele descobriu que os erros tanto nos comprimentos quanto nos ângulos da pirâmide eram mínimos. As paredes da galeria descendente eram perfeitamente retas, com variações da ordem de 6 milímetros, ao longo de 106 metros. Ele comparou a colocação das pedras do revestimento externo “ao mais delicado trabalho de um óptico, mas em uma escala de acres”. A qualidade do trabalho, contudo, começava a piorar na ante-sala da Câmara do Rei, levando o jovem topógrafo a levantar a hipótese de que o arquiteto original não terminara o trabalho. O resultado dos esforços de Petrie, apresentado em um livro de 1883 intitulado As Pirâmides e Templos de Gizé, foi ao mesmo tempo favorável e desfavorável a Smyth e aos piramidólogos. Petrie confirmou a relação equivalente a pi entre a altura e o perímetro da pirâmide. Descobriu também que o pi estava presente na relação entre o perímetro e o comprimento da Câmara do Rei. Mas o valor que obteve para a base da pirâmide era menor que o de Smyth, refutando assim a teoria do escocês de que o comprimento da base equivalia ao número de dias em um ano. Petrie também chegou a uma medida de cúbito diferente, e não encontrou qualquer indício favorável à querida polegada piramidal de Smyth.
Após constatar o que chamou de “pequena e feia ocorrência que destruiu a bela teoria”, Petrie embarcou em uma ilustre carreira como egiptólogo, que acabou rendendo-lhe um título de nobreza. E os números que encontrou para as dimensões da pirâmide permaneceram os mais confiáveis até 1925, quando um levantamento feito pelo governo egípcio acabou com todas as discussões numéricas.
Revelou-se então que os quatro lados apresentavam uma variação de comprimento que não ultrapassava 20 centímetros: o lado sul tinha 230,45 metros de comprimento; o leste 230,39; o oeste 230,36; e o norte 230,24 metros. Mais impressionante do que isso era o fato de os lados estarem perfeitamente alinhados com os quatros pontos cardeais. O cientista francês Jomard estimara a altura corretamente em 146 metros, mas errara no cálculo do ângulo dos lados, que é 51º 52’.
Mesmo tendo Petrie arrasado definitivamente a teoria dos piramidólogos, esta continuou atraindo adeptos, os quais não cessaram de fazer novas descobertas durante o século XX. O engenheiro britânico David Davidson, que começou suas investigações como agnóstico desdenhoso e em 25 anos tornou-se um verdadeiro crente, conseguiu reconciliar as descobertas de Petrie com as idéias de Smyth por meio de um complexo conjunto de cálculos que levava em conta a concavidade praticamente invisível das paredes da pirâmide (que não são na verdade completamente planas). Petrie não deixara de levar isso em conta, afirmou Davidson, mas ele não havia estendido essa projeção ao revestimento externo original. Ao fazer isso, segundo Davidson, via-se que a afirmação de Smyth, de que o perímetro representava o ano solar, estava correta. Em 1924, Davidson, o antigo cético, publicou um livro de 568 páginas no qual, após cerrada argumentação, concluía que a pirâmide era “a verdade em forma estrutural”.
Os adeptos das comparações numéricas continuariam a ser alvo de acusações de manipulação por parte da comunidade científica. Martin Gardner, um escritor moderno que pertence sem dúvida ao grupo dos céticos, ridicularizou a obsessão pelo número cinco de Joseph Seiss, aplicando o mesmo critério ao monumento a Washington, nos Estados Unidos. Segundo Gardner, além de o monumento ter uma altura de 555 pés e 5 polegadas, sua base tem 55 pés quadrados e suas janelas estão a 500 pés da base. O assim chamado, por Gardner, pé monumental, resulta em uma base de 56,5 pés, os quais, multiplicados pelo peso da pedra que fica no topo do monumento, resultam em um número muito próximo ao da velocidade da luz. Haveria aí alguma coincidência?, indaga Gardner.
As dimensões da pirâmide não foi o único aspecto investigado. Na mesma época em que Petrie e Davidson contavam cúbitos, outros estudiosos britânicos voltavam sua atenção para o céu. No final do século XIX, o astrônomo britânico Richard Proctor inaugurou os estudos sobre as pirâmides que receberiam o nome de arqueoastronomia. A pesquisa de Proctor revelou que, antes de ficar pronta, a Grande Pirâmide pode ter sido usada como observatório astronômico, conforme haviam dito os historiadores árabes e também o autor romano Proclo. O astrônomo britânico afirmou que o perfeito alinhamento das galerias internas em relação ao eixo norte-sul, e também ao fato de apresentarem uma inclinação de 26º, permitiam que os egípcios as utilizassem como se fossem um telescópio. Ao observarem os fenômenos celestes através da abertura no início da galeria, os antigos astrônomos teriam condições de mapear o céu setentrional. Aqueles que se colocassem na Grande Galeria da pirâmide – Proctor chamou-os de “guardiães da noite” – poderiam ter registrado o trânsito das principais estrelas através de um arco de aproximadamente 80º. Quando, terminada a construção, as galerias foram fechadas, esses antigos astrônomos teriam perdido seus postos de observação.
Os egiptólogos replicaram que a ciência egípcia não era assim tão avançada, mas a tese de Proctor recebeu significativo apoio quando o eminente astrônomo britânico Sir J. Norman Lockyer publicou, em 1894, um livro sobre as pirâmides e as estrelas intitulado A Aurora da Astronomia. Lockyer não era alguém que se pudesse ignorar. Descobridor do hélio, membro da Sociedade Real e erudito enobrecido pela rainha Vitória por suas realizações científicas, Lockyer visitou as antigas construções egípcias e observou que estavam orientadas na direção em que nascem e se põem o sol e certas estrelas importantes, em determinada épocas do ano.
Mais tarde, chegou a conclusões semelhantes em relação aos megálitos britânicos de Stonehenge. Lívio Stecchini, professor norte-americano de história da ciência e especialista nos sistemas de medidas da Antigüidade, afirmaria mais tarde que as meticulosas observações astronômicas dos egípcios possibilitavam o cálculo de um grau de longitude e latitude com precisão de poucas centenas de metros, um feito que seria repetido somente 4 mil anos depois, no século XVIII.
O esforço de decodificação da pirâmide avançaria pelo século XX, contribuindo para o aumento do número de teorias, especulações e lendas. A idéia mais intrigante – e, com frequência, a mais ridicularizada – a surgir nas últimas décadas não se refere propriamente à Grande Pirâmide, mas à forma piramidal. De acordo com alguns teóricos, há nessa forma um fator inexplicado, do qual emana uma força capaz de atuar sobre objetos, plantas e até mesmo pessoas.
Essa idéia, que veio a ser conhecida como o poder das pirâmides, originou-se de uma série de observações e experimentos realizados a partir da década de 20. Contudo, seu primeiro indício foi constatado em 1859, no próprio centro do grande enigma, a misteriosa montanha de pedra em Gizé.
Werner Von Siemens, o fundador do gigantesco conglomerado alemão de indústrias, visitou Gizé naquele ano ao conduzir um grupo de engenheiros até o mar Vermelho, onde sua companhia instalava um cabo telegráfico. Sempre curioso e empreendedor, Siemens decidiu escalar a pirâmide e, enquanto o fazia, o vento do deserto levantava uma pálida névoa de areia ao seu redor. Ao chegar no topo, Siemens fez uma pose de vitória, apontando um dedo para o ar. Nesse momento, sentiu uma ferroada no dedo e ouviu um ruído agudo. O efeito foi semelhante a um leve choque elétrico. Siemens, que estava a par dos avanços da nascente ciência da eletricidade, resolveu fazer uma experiência.
Colocando papel molhado em volta de uma garrafa de vinho com gargalo de metal, Siemens improvisou uma garrafa de Leyden, um dispositivo simples que armazena eletricidade estática. Retornando ao topo da pirâmide, segurou a garrafa acima da cabeça e verificou satisfeito que a garrafa se tornara eletricamente carregada, produzindo fagulhas quando tocada.
A experiência elétrica de Siemens não foi, em si mesma, especialmente importante. sob certas condições atmosféricas, outros já haviam notado efeitos similares no topo de edifícios altos e pontiagudos. Difícil, contudo, é explicar o fenômeno ainda mais estranho relatado, no início da década de 30, pelo comerciante francês Antoine Bovis. Segundo Bovis, ao visitar a Câmara do Rei por volta de 1920, ele encontrou restos mortais de vários gatos e outros animais pequenos que aparentemente haviam morrido na pirâmide. Curiosamente, os corpos não exalavam odor. Ao examiná-los, Bovis descobriu que os animais haviam sofrido um processo natural de desidratação e mumificação, a despeito da umidade na Câmara. De volta a Nice, o francês resolveu pesquisar o que ocorrera. Após construir um modelo da pirâmide em madeira, orientou-o para o norte e colocou no interior um gato recentemente morto. O corpo ficou mumificado em questão de dias. Bovis repetiu a experiência com outros animais mortos, com carne e com ovos; em todos os casos, afirmou ele, a matéria orgânica secava e ficava mumificada ao invés de apodrecer.
Ainda mais impressionante foi a revelação seguinte. O engenheiro tcheco Karl Drbal, após ouvir falar da experiência de Bovis, resolveu reproduzi-la empregando uma pirâmide de papelão para mumificar pedaços de carne e flores. Colocou uma lâmina de barbear dentro de seu modelo de cerca de 15 centímetros, em uma posição correspondente ao local da Câmara do Rei. Drbal esperava que a lâmina perdesse o fio. Para sua surpresa, contudo, ela ficou mais afiada do que antes. E ele afirmou que, em experiências subsequentes, recuperou o fio de lâminas de modo a poder utilizá-las até duzentas vezes.
Drbal sugeriu que uma energia desconhecida afetava a estrutura das lâminas. Após uma espera de dez anos, o departamento de patentes tcheco acabou vencendo o ceticismo e em 1959 expediu uma patente para Drbal pelas pirâmides de papelão (mais tarde de plástico) que ele chamou de Afiadores de Lâminas de Barbear Pirâmide Quéops.
As forças atribuídas às formas piramidais continuaram a se multiplicar. Segundo alguns, as pessoas podem aproveitar as influências benignas da energia das pirâmides entrando em uma pequena pirâmide de plástico. Os efeitos terapêuticos incluem a diminuição de cólicas menstruais, o aguçamento da acuidade mental, a tranquilização de crianças, a melhora do sono e o aumento da potência sexual. Um dentista da Califórnia pendurou 72 pequena pirâmides de metal sobre o local onde trata seus pacientes e afirmou que ele passaram a sentir menos dor e a recuperar-se mais rápido.
G. Patrick Flanagan, de Glendale na Califórnia, um dos principais promotores do poder das pirâmides, alega que uma forma de energia chamada biocósmica está presente nos objetos piramidais. Descreveu-a pomposamente como “a essência da própria força vital”. Como objetos de pesquisa, Flanagan usou desde brotos de alfafa até seu poodle de estimação: os brotos cresceram mais rápidos e o cão, depois de dormir por várias semanas no interior de uma delas, tronou-se vegetariano. Do mesmo modo que Drbal, Flanagan comercializou seu achado, vendendo barracas piramidais e placas energizadoras feitas de inúmeras pirâmides minúsculas.
Essas teorias, contudo, não foram bem recebidas pela maioria dos cientistas. Experiências realizadas pelo Instituto de Pesquisas de Stanford na Grande Pirâmide mostraram que os alimentos armazenados em seu interior deterioravam normalmente. O geólogo Charles Cazeau e o antropólogo Stuart Scott, conduzindo uma pesquisa independente, relataram por sua vez que “os ovos (…) retirados de nossa pirâmide após 43 dias, estavam malcheirosos, de um amarelo grudento e cheios de sedimentos (…) os tomates nas pirâmides não se saem melhor do que aqueles em sacos de papelão. Não conseguimos afiar lâminas de barbear”.
Os pesquisadores continuam a buscar respostas para os enigmas da Grande Pirâmide. Perguntas do tipo quem, como e por quê vêm intrigando todos os que visitam Gizé, há mais de dois milênios. Em meados da década de 80, os egiptólogos levantaram o primeiro mapa detalhado do planalto de Gizé, para analisar a construção da pirâmide. Utilizando sofisticados teodolitos e fotografias aéreas, o arqueólogo Mark Lehner e sua equipe detectaram pedreiras nas proximidades e deduziram um método pelo qual os antigos egípcios poderiam ter construído a base assombrosamente plana da pirâmide. Segundo esses pesquisadores, após abrir trincheiras na rocha e inundá-la, os antigos egípcios poderiam ter feito as marcações topográficas para a base em estacas de madeira mergulhadas na água.
O químico francês Joseph Davidovits foi ainda mais longe: em 1974, chegou à conclusão que os egípcios teriam sido mais químicos do que os pedreiros. Após analisar amostras de rochas da pirâmide, Davidovits argumentou que os enormes blocos foram fundidos e não cortados. Segundo ele, uma substância semelhante a uma massa de vidraceiro era preparada no local a partir de líquidos e minerais disponíveis. Essa mistura era derramada em um molde e aquecida lentamente, até assemelhar-se ao granito. Embora tenha produzido tais pedras em seu laboratório, Davidovits não convenceu os arqueólogos de que os egípcios haviam feito o mesmo nas areias de Gizé.
Os piramidólogos ainda não abandonaram os temas familiares da profecias e revelações. O escritor Max Toth anunciou que apenas a descoberta de um aposento secreto impede o encontro do homem do século XX com os “Mestres dos Mistérios”, que aguardam silenciosamente o momento de “recobri-lo com as vestimentas da verdade”.
Outros visionários consideravam a pirâmide o elo perdido entre a história registrada e a Atlântida. Manly P. Hall, estudioso de antigas religiões, sugeriu que os cientistas mais talentosos da civilização altamente desenvolvida na Atlântida, conscientes de que o desastre era iminente, fugiram para o Egito e construíram a pirâmide, como um repositório de seus conhecimentos e de seus tesouros. Ao ocultarem sua sabedoria na pirâmide, os avançados atlantes teriam assegurado que apenas aqueles que a merecessem seriam capazes de descobri-la e compreendê-la.
Por mais fantasiosa que seja a tese de Hall, os segredos da pirâmide continuam sem solução, a despeito dos esforços dos cientistas tradicionais e de piramidólogos pouquíssimo tradicionais. Mas, qualquer que seja nossa posição, não podemos ignorar a existência da Grande Pirâmide; ela nos assombra e nos frustra. William Fix, o autor de Odisséia da Pirâmide, coloca: “Ela é enorme; ela é antiga; ela é lendária; ela é sofisticada; ela é o resultado de um grande empreendimento; ela está aqui à vista de todos na encruzilhada da Terra – e ela não parece pertencer a nosso mundo.”
(Texto traduzido por Luiz Alberto Moura Araujo da Obra Todo Egito de Abbas Chalaby e transcrito da Obra Mistérios do Desconhecido / tradução de Cláudio Marcondes e Heloísa Jahn)
Fonte: www.luizalberto.com.br
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